Segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca), todos os anos mais de 12 milhões de pessoas são diagnosticadas com a doença — e 8 milhões morrem. No Brasil, o instituto estima 596 mil novos casos de câncer em 2016, dos quais 15.490 devem ser câncer de boca — 11.140 homens e 4.350 mulheres. Para tentar frear estes números, acelerando o diagnóstico, estudantes da Universidade Federal do Paraná (UFPR) passaram um ano fazendo visitas domiciliares para prevenir o câncer bucal.

“O câncer da boca, ou da região da cabeça e pescoço, sofre pela ausência de critérios preventivos mais claros que possam ser seguidos para diagnóstico”

Cassius Pereira, professor do Programa de Pós-Graduação em Odontologia da UFPR

A iniciativa faz parte da pesquisa de mestrado de Allana Pivovar, intitulada “Rastreamento ativo de câncer bucal orientado para tabagistas na atenção básica“, que foi realizada sob a orientação do professor Cassius Carvalho Torres Pereira, do Programa de Pós-Graduação em Odontologia (PPG-Odonto) da UFPR, e se tornou um projeto de extensão envolvendo estudantes da graduação em Odontologia da UFPR e de outras universidades. A Campanha de Rastreamento Ativo do Câncer de Boca realizou cerca de mil visitas domiciliares e 500 entrevistas com homens na faixa etária de risco (50 a 65 anos) cadastrados no território da Unidade de Saúde Trindade II, no bairro Cajuru, em Curitiba.

De 250 exames, foram encontradas 60 lesões suspeitas e um caso de câncer bucal. Esse número equivale a 28% dos avaliados, média muito superior a outros exemplos encontrados na literatura científica. “Em outros artigos e propostas de rastreamento, esse número fica em torno de 3 a 4%. Ou seja, esse valor altíssimo é porque estamos sabendo buscar onde os casos realmente estão”, explica Allana.

“Identificamos que para vários tipos de câncer existem abordagens preventivas bem estabelecidas, com protocolos bem rigorosos. Por exemplo, tumores de mama e de colo do útero nas mulheres e na próstata nos homens têm guias de conduta que são bem semelhantes no mundo todo”, conta Pereira. “E o câncer da boca, ou da região da cabeça e pescoço, se formos pensar mais amplamente, sofre um pouco pela ausência de critérios preventivos mais claros que possam ser seguidos pelos profissionais”.

Metodologia direcionada explica percentual maior de casos

Envolvendo a formação dos participantes, a prestação de serviços à comunidade e o desenvolvimento de um método que possa ser usado em grande escala pelo Sistema Único de Saúde, o projeto abrange ensino, pesquisa e extensão. Na primeira etapa, o público-alvo – homens entre 50 e 65 anos, fumantes e ex-fumantes — foi selecionado dentro da população escolhida para o estudo. Estes passaram, então, por exames mais aprofundados e aqueles que apresentaram lesões foram encaminhados para uma biópsia.

A campanha realizou cerca de mil visitas domiciliares e 500 entrevistas com homens na faixa etária de risco em Curitiba. Foto: PPG-Odonto/Acervo
A campanha realizou cerca de mil visitas domiciliares e 500 entrevistas com homens na faixa etária de risco em Curitiba. Foto: PPG-Odonto/Acervo

A campanha realizou cerca de mil visitas domiciliares e 500 entrevistas com homens na faixa etária de risco em Curitiba. Foto: PPG-Odonto/AcervoSegundo o pesquisador, basta um exame visual e de toque para identificar lesões que possam apresentar riscos aos pacientes “É muito mais acessível quando comparado com outros exames como a mamografia, que exige equipamentos, aumentando seu custo”. Já que as feridas não causam muita dor, os pacientes com câncer de boca acabam chegando até o atendimento de saúde com a doença já em estágios avançados, o tratamento precisa ser mais agressivo e a sobrevida das pessoas piora.

Por isso, começa a crescer a cultura de buscar os pacientes, especialmente nos casos em que já exista um histórico de saúde ou comportamental prejudicial — como o tabagismo, que agrava muito os riscos do câncer de boca. “Além de o Brasil ter índices de ocorrência [da doença] maiores do que outros países, o Sul do Brasil também se destaca em relação ao restante do país, por ter maiores índices de tabagismo”, aponta a mestranda.

“A nossa hipótese era que por conta do atraso [em buscar ajuda médica], dos sintomas muito tardios e da dificuldade do profissional [médico ou dentista] de ter o olhar direcionado para o exame da boca, ir até a casa das pessoas em faixa de risco poderia representar chances de encontrar as lesões mais cedo, e, por consequência, começar o tratamento mais cedo”, diz o professor.

📖 Publicado originalmente na Revista Ciência UFPR (V. 1, nº 2, 2016).
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