BOLETIM UFPR | De baleias a tartarugas, conheça as espécies que são visitantes frequentes do litoral paranaense
O litoral paranaense recebe a visita constante de turistas do mundo inteiro. Mesmo nos meses frios, de inverno, esses visitantes fazem longas viagens para aproveitar as praias aconchegantes e produtivas do estado. Entre os hóspedes mais comuns estão os pinguins-de-magalhães, os lobos-marinhos, as tartarugas-verdes, as baleias e os bobos-pequenos (espécie de ave marinha).
Apesar do gosto pelas águas da costa paranaense ser comum entre esses animais, as origens e os motivos que os trazem até aqui são bastante diversos. Os pinguins-de-magalhães, por exemplo, são presenças cativas todos os anos na costa sul e sudeste brasileira e vêm das áreas reprodutivas no Estreito de Magalhães, Patagônia Argentina, em busca de alimento. Já as baleias, francas e jubartes, fazem o processo inverso: alimentam-se nas zonas frias da região antártica e patagônica e buscam as águas paranaenses para se reproduzirem e cuidarem de seus filhotes.
“No caminho, alguns animais encontram regiões com muitas presas e passam um período maior se alimentando para, então, subirem à costa. Outros passam mais tempo na busca de alimento ou encontram áreas de descanso. Cada indivíduo leva o seu tempo”.
Os lobos-marinhos-subantárticos (Arctocephalus tropicalis) são outros visitantes assíduos. Este ano, o Laboratório de Ecologia e Conservação (LEC) da Universidade Federal do Paraná (UFPR) está acompanhando um indivíduo dessa espécie, que é originária das ilhas subantárticas localizadas ao norte da Antártica, desde o dia 29 de julho. Até o momento, esse é o maior período que um animal marcado pelos especialistas passou em águas paranaenses. O turista tem aproveitado a estada para descansar e procurar alimentos. Atualmente, ele segue a região costeira rumo ao norte e repousa nas praias do Parque Nacional do Superagui.
Do hemisfério sul, o estado também recebe os lobos-marinhos-do-sul (Arctocephalus australis), cujas colônias reprodutivas são no Uruguai e na Argentina. As focas-caranguejeiras (Lobodon carcinophagus) e as focas-leopardos (Hydrurga leptonyx) vêm da região antártica, muito mais ao sul.
A bióloga e coordenadora do LEC, Camila Domit, explica que esses animais que vêm do sul normalmente chegam à costa brasileira entre os meses de maio e julho e ficam até setembro e outubro e que existe uma variação no tempo de deslocamento deles entre as áreas ao sul e o litoral do Paraná. “No caminho, alguns encontram regiões com muitas presas e passam um período maior se alimentando para, então, subirem à costa. Outros passam mais tempo na busca de alimento ou encontram áreas de descanso. Em geral, eles não fazem uma viagem em linha reta, mas com várias paradas, e cada indivíduo leva seu tempo”.
Condições da água favorecem migração
A temperatura e a salinidade da água são alguns dos fatores que determinam a distribuição da fauna marinha e, portanto, influenciam na migração. “Os animais são sensíveis a esses parâmetros e, normalmente, buscam condições mais favoráveis”, aponta o professor e responsável pelo Laboratório de Oceanografia Costeira e Geoprocessamento no Centro de Estudos do Mar (CEM), Maurício Almeida Noernberg.
Durante o inverno, a média de temperatura das águas que banham o litoral paranaense é de 19 a 20 graus Celsius. Enquanto nas regiões mais ao sul do hemisfério, é mais baixa. Nas Ilhas Malvinas, na Patagônia, por exemplo, a temperatura varia entre 5 e 7 graus, dependendo da latitude.
De acordo com Noernberg, a massa de água que vem do sul é mais fria, menos salina e rica em nutrientes. “Ela tem influência da desembocadura do Rio da Prata, na Argentina”. Em função do padrão de ventos e do relaxamento da corrente do Brasil, essas águas atingem latitudes menores na estação mais fria do ano, chegando ao litoral do Paraná. “No final do inverno, essa massa de água começa a ter menos influência e a diminuição da intensidade das frentes frias favorece o retorno dos animais ao sul”.
A configuração da costa litorânea do Paraná faz dela uma região mais abrigada e a presença de estuários, isto é, ambientes aquáticos de transição entre rio e mar, tornam a água mais produtiva, propiciando a busca dos animais pelo local.
Cientistas mapeiam espécies marinhas
Por meio do monitoramento realizado por equipes de pesquisadores do mundo inteiro, é possível observar os trajetos realizados por alguns animais. É o caso das tartarugas-verdes, cujo programa de marcação se estende ao longo de toda a costa brasileira e uruguaia. “É um trabalho que o Projeto Tamar faz há mais de 30 anos, que nós também fazemos aqui no Paraná desde 2015, além de outros projetos pelo país que vêm desenvolvendo ferramentas de mapeamento da fauna marinha”, conta Camila.
As marcações são feitas com a colocação de anilhas e brincos com códigos ou, ainda, por microchips subcutâneos. A equipe da UFPR também utiliza transmissores satelitais, hastes de fibra ou carbono que enviam sinais para satélites, permitindo triangular a localização dos animais rastreados e retransmitindo a informação aos pesquisadores em terra (sistema Argos).
Esse trabalho desenvolvido no Paraná com as tartarugas juvenis é pioneiro. “Dos 20 transmissores fixados em juvenis de tartarugas-verdes, pudemos notar que alguns indivíduos se deslocaram entre Bahia, São Paulo e Rio de Janeiro, mas muitos foram parcialmente residentes em nosso litoral”, destaca Camila. O estudo é parte da dissertação de mestrado da oceanógrafa Tawane Nunes e pretende verificar como as tartarugas dessa espécie utilizam o litoral do estado.
Outra espécie que viaja com frequência para o Paraná é a dos bobos-pequenos (Puffinus puffinus), que vem da região do Reino Unido no hemisfério norte. Pelo fato de muitos deles serem anilhados nas áreas reprodutivas, é possível saber que alguns fizeram esse longo trajeto em aproximadamente 60 dias.
Já o monitoramento em animais cuja marcação não é visível, como as feitas por microchips, é mais difícil. Entretanto, há bons resultados que demostram os deslocamentos ao longo da região sul e o tempo de migração. “Há relato de um lobo-marinho-do-sul marcado no Paraná que foi avistado na zona reprodutiva, no Uruguai, cerca de cinco meses após a marcação. Ainda temos muito a avançar nestes estudos, mas as técnicas estão sendo aprimoradas”, comenta a bióloga. Ela reforça que muitas histórias sobre a biologia destes animais só podem ser conhecidas pela ciência devido ao uso deste processo de marcação e recaptura.
O trabalho de marcação é importante para conhecer as áreas de deslocamento dos animais, quais são as regiões de alimentação e de reprodução e entender não só o padrão biológico e ecológico dessas espécies, mas de que maneira estão expostas a atividades humanas. A pesquisadora conta que o entendimento comum é de que o impacto causado pelo ser humano é maior dentro de estuários ou baías e na zona costeira, mas que é importante também proteger os animais ao longo de seus processos migratórios. “Entender quais áreas sobrepõem regiões pesqueiras ou portuárias e quais são os locais de exploração de petróleo e gás é essencial para que os processos de licenciamento e ordenamento dessas atividades sejam executados de maneira a conservar essas espécies marinhas com quem compartilhamos os oceanos”.
Conheça o projeto que monitora baías
O Projeto de Monitoramento de Praias da Bacia de Santos (PMP-BS) é uma atividade desenvolvida para o atendimento de condicionante do licenciamento ambiental federal das atividades da Petrobras de produção e escoamento de petróleo e gás natural na Bacia de Santos, conduzido pelo Ibama.
Esse projeto tem como objetivo avaliar os possíveis impactos das atividades de produção e escoamento de petróleo sobre as aves, tartarugas e mamíferos marinhos, através do monitoramento das praias e do atendimento veterinário aos animais vivos e necropsia dos animais encontrados mortos.
O PMP-BS é realizado desde Laguna/SC até Saquarema/RJ, sendo dividido em 15 trechos. O Laboratório de Ecologia e Conservação da UFPR monitora o Trecho 6, compreendido entre os municípios de Guaratuba e Guaraqueçaba.