Dentro de sua sala no Setor de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), em Curitiba, cercada dos equipamentos de estudiosos de abelhas — microscópio, lupa e puçá, por exemplo — a professora Danuncia Urban construiu um silencioso reinado. Depois de aposentada da universidade, o que ocorreu em 1991, ela continuou por mais de dez anos uma das principais catalogadoras das abelhas da região neotropical do planeta. Em 2007, era a sexta principal taxonomista desse tipo de inseto.
Seis anos depois — quando saiu o “Catalogue of bees in the neotropical region”, da Sociedade Brasileira de Entomologia (ela é uma das organizadoras), Danuncia tinha 80 anos e havia subido para o quinto lugar devido aos 13 papers que publicara no período.
Cada um dos mais de cem artigos da cientista traz as típicas descrições ultra-minuciosas da morfologia das espécies. Chama a atenção, porém, o fato de a maioria ter um “agradecimento” no pé do texto — o que não é tão incomum, mas geralmente direcionado a financiadores. Já ela agradecia colegas por fotos cedidas, bibliografia emprestada e até por sugestões de nome para novas espécies.
“Não era uma pesquisadora vaidosa para se auto-divulgar”
“A Danuncia não era muito famosa porque não era vaidosa para se auto-divulgar. Era quietinha, agradável, mesmo sendo a ‘cacicona’ das abelhas do gênero dela”, conta Olaf Mielke, de 77 anos, professor do Departamento de Zoologia da UFPR, que batizou uma borboleta com o nome da colega que não gostava de viajar de avião. Aos não entomologistas, uma amostra da relevância de Danuncia está à distância de uma pesquisa no Google — a biografia no portal Pioneiras da Ciência no Brasil, do CNPq.
A pesquisadora nasceu em Curitiba em 1933, em uma família de agricultores poloneses que deixaram São Paulo pelo Paraná. Na época, a capital era uma cidade ainda separada em bairros étnicos. A própria Danuncia falou apenas polonês até entrar na escola — a história está no artigo “Danuncia Urban: a life devoted to Entomology”. A vida acadêmica começou por convite do Padre Jesus Santiago Moure, fundador da Zoologia na UFPR, de quem ela foi ajudante até ingressar na docência.
Presença assídua na UFPR até meados dos anos 2000, a pesquisadora parou de frequentar o Politécnico só quando a memória começou a falhar severamente. Até hoje há quem sinta falta dela no departamento. “Era minha parceira de almoço. Sempre sinto saudade dela ao meio-dia”, conta a professora Mirna Casagrande.
De qualquer forma, Danuncia continua divertindo amigos e familiares no seu apartamento em Curitiba, onde conta histórias como a do dia em que escapou de ser assaltada por distração: achou que o ladrão era um pedinte e ofereceu a ele uma “bala” que estava na sua bolsa — e ele saiu correndo.